17 de julho de 2008

Os Covões

Como o dinheiro não abundava nem sempre ia-mos à piscina, assim a malta juntava-se pegava nas biclas e lá ia para os Covões, uma represa ou melhor uma poça de água no meio do mato mais de meia hora pra lá do cemitério, bem no meio dos sobreiros que para lá chegar tinha de ir um rôr de tempo por uma estrada de terra batida embora a de alcatrão também não fosse melhor tantos eram os buracos que mais parecia um queijo suíço, na altura já quase todos tinham BMX só eu é que tinha uma Vilar GT Catita e o Cabeçudo tinha uma Pasteleira que era do avô dele. Assim à hora combinada na véspera, quase sempre durante o jogo de esconder, passatempo preferido das noites de Verão, lá nos juntávamos no campo da bola e pedalava-mos por montes e vales curvas e contra curvas pó e cascalho até aos Covões, levava-se sempre a "buxa" uns papo-secos com manteiga ou Tulicrme uns Caprisones ou uma garrafa vazia e um pacote de Tang que água havia com fartura na dita represa, felizmente ninguém morreu nem nunca soube de nenhuma gastroenterite e também ninguém nunca se perguntou de onde vinha aquela água toda ali no meio do mato, de onde vinha para onde ia e porque é que mesmo no pino do Verão era sempre fresca, bom mas isso agora não interessa nada. O certo é que eu era sempre o ultimo a chegar mesmo com mudanças a minha bicla era a mais lenta, ou eu o mais preguiçoso que até o cabeçudo chegava primeiro e depois já com todos na água tinha de me despir com todos a olhar pra mim o que no fundo eu até gostava, fazia sempre um míni numero de strip com o Bruno à beira com àgua pelos joelhos e a fazer de conta que a gaita era um microfone e a cantar "Touch me, touch me. I want to feel your body" e prontos despidos os turces lá ia pra dentro de água e como não sabia nadar ficava-me sempre ali pela beira muitas vezes sozinho outra, a maioria, com o Zé Carlos a fazer-me companhia que ele gostava muito de "brincar" aos microfones, e lá ficava eu de papo pó ar meio dentro de água com ele a "cantar" ao microfone. O lanche era sempre uma festa, era sempre a ver quem tinha a sandes melhor e a trocar "toma lá uma de Tulicreme e dá cá uma de marmelada" "foda-se quem é que me roubou o papo-seco com doce de tomate?" o Carlitos tinha sempre um com doce de tomate que o Bruno roubava sempre e depois metia o coiso lá dentro e punha-se "queres tomate queres? agora tens de o vir cá alember" e a malta ria-se a bandeiras despregadas com aquilo é que o Carlitos era muito mas mesmo muito envergonhado, sempre que a malta se punha assim nas "brincadeiras" enquanto os outros por regra faziam vista grossa ele ficava vermelho que nem um tomate e não consegui desviar os olhos da acção, o coitado queria era festa mas a timidez não deixava e assim que alguém lhe tocava fugia logo e encolhia-se todo e era o único que tomava banho de truces, não sei porquê que aquilo via-se tudo na mesma e o rapaz apesar de ser mais novo que nos até nem tinha nada com que se envergonhar, então um dia combinamos todos fazer uma barrela ao Carlitos e assim foi depois do lanche ia-mos sempre "dormir" a sesta deitávamo-nos à sombra de um sobreiro e passava-se assim pelas brasas nunca dava para dormir profundamente que havia sempre algum gemido ou algum "ái foda-se que tá-me a doer" e aquilo despertava e acabava-mos sempre em "festa", todos menos o Carlitos, ora um dia quando nos deitamos o Cabeçudo diz que vai mijar e dá assim a volta por trás e atira-se por cima dele, a malta alevanta-se toda e agarra-o uns pelos pés outros nos braços e ali ficou ele aos berros de "larguem-me larguem-me que eu digo à minha mãe" então eu o Bruno e o Zé Carlos despimo-lo dos truces e vai de encher de folhiço e lama esfregar com terra e não é que então sem mais e com o tipo sempre a torcer-se aquilo levanta que parece uma morcela cacholeira, "larguem-me foda-se vocês vão ver se eu não conto ao meu pai seus cabrões" e vai o Bruno pega numa garrafa com água e começa a lavar aquilo "prontos prontos meu menino ca gente na te faz mal" e mal aquilo tá ali limpinho e brilhatezinho deu-lhe pa começara a brincar com ele, cosseguinha aqui, festinha alem, e vai acima e vai abaixo e o Carlinhos só já dizia "ài foda-se não pares" e prontos nesse dia ninguém dormiu a sesta e pode-se dizer que foi o melhor dia que passamos nos Covões naquele ano, é claro que a partir dai o Carlitos nunca nos largava sempre a perguntar quando é que lá íamos outra vez e um dia o Zé carlos disse-lhe "se queres eu vou lá mas tem de ser agora" e ele não percebeu e teve de o gramar à força nos balneários do ringue desportivo e depois contou ao irmão que na altura já devia ter prái uns vinte anos e ele vai ter com o Zé Carlos e arriou-lhe uma carga de porrada e um dia foi com os amigos dele ter aos Covões e apanharam a malta na "brincadeira" e depois dizem que foi uma festa. Dizem que eu nesse dia não fui. Infelizmente.

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