16 de julho de 2008

Sandes de mortadela

Com o Verão chegava sempre o calor e com o calor as idas à piscina municipal, quer dizer ao tanque municipal que aquilo de piscina para além das pranchas e de uns quantos azulejos azuis pouco tinha de piscina. Apanhávamos a camioneta às 7 da manhã e depois de mais ou menos meia hora de viagem lá chegávamos aos "jardins da piscina" uma pedaço de relva mal cuidada com umas árvores raquíticas em volta de um suposto campo de ténis que nunca vi ninguém usar e das ditas piscinas, esperava-mos até às nove e meia, hora em que por vinte escudos se podia dar entrada no magnifico mundo da pesca submarina, assim das sete e meia mais coisa menos coisa até às nove e meia era ver-nos escarrapachados na relva ou a jogar às cartas, que o Bruno tinha um daqueles baralhos com gajas nuas que lhe tinha saído num daqueles jogos que havia no café do Ti Jorge onde a malta ia beber as gasosas com groselha e se furava um papelão de onde saia uma bola com um numero que dava direito a um prémio, uma navalha ou um chocolate Regina ou uma caneta Bic laranja ou um lápis ou uma merda assim do género, quer dizer as navalhas até que davam jeito e os chocolates sempre dava para dar às miúdas a troco de um beijo ou para ver a "passarinha", ora um dia saiu ao Bruno um destes baralhos, o que foi uma alegria que assim para alem de podermos jogar ao "Créps" e á Copa sempre nos podíamos entreter as ver as beldades que às vezes até nos esquecíamos de jogar, e lá vinha sempre alguém, por norma o parceiro "joga lá essa merda pá e para de olhar pás gajas que não tens piça pa isso", quando não se jogava às cartas ficava-mos por ali deitados na conversa a ver a malta da cidade. Assim que se comprava o bilhete era um ver se te avias para chegar aos balneários, umas cabines minúsculas com umas portas de contraplacado e com uma particularidade que só anos mais tarde descobri para o que é que realmente aquilo servia, em praticamente todas havia um buraco que comunicava entre cabines, e onde o Rui estava sempre a enfiar o coiso e a gritar para o outro lado "mama lá aqui a ver se eu deixo?" mas acho que nunca ninguém mamou, acho. Já dentro do recinto da piscina havia três sítios distintos, a zona do terraço, uma laje de cimento por cima dos balneários para onde a malta ia sempre e ái de quem lá pusesse o cú que levava logo logo uma arrochada que connosco ninguém se metia, a zona da relva que ficava mesmo por baixo do terraço e para onde iam a miúdas e os gajos assim mais pó efeminado porque era uma parte onde quase não havia sol e a zona do bar para onde ia a malta mais velha. Era sempre uma correria a ver que escolhia os melhores lugares, aqueles junto a grade para poder ficar deitado a ver as gajas e a escarrar cá para baixo para cima dos larilas e um dia o Zé Carlos até que andou à briga com um que se chamava Banquinho e até era bem giro que depois ficaram amigos e tudo e por mais que uma vez até iam à casa de banho os dois porque o Zé Carlos dizia que como aquilo não tinha fechadura tinha de ter alguém a segurar a porta senão não era capaz de fazer e um dia quem foi com ele fui eu e ele é que me fez, no terraço havia ainda a particularidade de se poder ver todo o recinto, ou seja podia-se dali micar quem ia à água e se interessasse ir também, um dia a Susana, uma gaja já mais velha da zona do bar foi à água com um biquíni branco e sem demoras ai vou eu escada abaixo que tinha de ver aquilo mais de perto e de preferência debaixo de água mas a pressa foi tanta que ao chegar à beira da piscina escorreguei, bati com o cú no chão e rebolei por ali a fora e fui cair na parte dos dois metro, ora como na altura não sabia nadar muito bem ou quase nada o que me valeu foi o Alexandrino, o empregado do bar da piscina que me foi lá buscar que se não agora não estava aqui a escrever estas linhas, foi nesse dia que abri os olhos e mudei-me para a zona do bar, tinha cadeiras, mesas, miúdas giras, sandes, sumos e o Alexandrino, um metro e noventa de músculos olhos verde azulados cabelo à Macgyver e uns calções de Lycra azul assim tipo ciclista por onde sobressaiam todos os atributos do meu salvador, alem de tudo isto era um tipo mesmo muito simpático e conversador e quando não havia trabalho sentava-se ao pé de mim punha-me a mão na perna e dizia "pois é ó Bisnaga agora vê lá na te afogues outra vez que hoje tô com mau hálito" e ria-se a bandeiras despregadas com um vozeirão que parecia um tempestade seca no mês de Agosto que um vez fomos todos, eu o Zé Carlos o Bruno o Moi e o Mendes para os campos ao pé do cemitério ver os relâmpagos e o que valeu foi o sino da capela que amparou o primeiro raio o pior foi o segundo que pôs aquela merda toda a arder e tivemos de sair dali a correr e chamar a Ti Alice que morava na primeira casa para chamar os bombeiros e depois toda gente disse que fomos uns heróis que senão tinha ardido tudo, e depois esfregava-me sempre as costas e lá ia servir mais umas sandes e gasosas, o Alexandrino não a Ti Alice que tinha as mãos cheias de verrumas, quem trabalhava tambem no bar era o Vesgo que trocava sempre os pedidos todos e uma vez até deu um Tang de morango à Morcega que era alérgica e ela teve de ir para o hospital e o Alexandrino teve de lhe dar na cabeça, do Vesgo não da Morcega. O Alexandrino tinha sempre muitos amigos de volta dele todos os rapazes giros da zona do bar pareciam abelhas em volta do mel “ó Xandre é uma sandes de mortadela e uma míni faz favor” “ó Xandre é um caprisone de laranja e uma sandes de mortadela faz favor” “ó Xandre é uma sandes de mortadela e...” e era isto o tempo todo, que as sandes de mortadela eram a especialidade do bar e vai um dia não levei almoço e cheguei assim ao pé do balcão e pedi com uma voz meio sumida "ó Alexandrino era uma sandes de mortadela fáz favor" e vai ele começa a rir-se olha para mim e diz "ó puto pra ti não há mortadela que ainda tens de comer muito feijão a ver se cresces". Depois o Bruno é que me disse o que se dizia à boca pequena, é que o Alexandrino não aviava só no balcão também aviava umas certas “sandes de mortadela” lá por traz do bar. Diziam, que eu cá nunca comi nenhuma. Infelizmente.

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